terça-feira, 25 de janeiro de 2011

divorce song – liz phair



do álbum exile in guyville, de 1993.


antes de mais nada, uma música de roteirista por excelência. pelos detalhes rigorosamente perfeitos. pelo cinismo comedido, o máximo de comedimento que levar seus sentimentos à flor da pele pode acarretar. "divorce song" é digna de raymond carver, pela narrativa bronca, áspera (notar a secura totalizante do título). para começo de conversa, ela se coloca no lugar dele quando diz que, ao pedir quartos separados num motel, logo se arrepende ao saber de que forma o tal pedido soou para ele. literalmente: soou. não como o pedido transpareceu no semblante dele, mas sim como ele soou nele, ecoou nele, retumbou nele. do mesmo modo, ela fala que ele disse que não valia a pena conversar com ela – e novamente: se ele soubesse como aquilo soou para ela, ele teria recolhido suas palavras, trancando-as numa caixa, enterrando-a, queimando-a e por fim jogando ela fora. ótimo. cada uma das partes ganha o direito de magoar a outra 1 (uma) vez e pronto. a beleza da música reside em estabelecer em poucos versos a intimidade que une o casal, mas que não mais o unirá a partir da primeira noite em quartos separados num motel de beira de estrada. aparentemente, ela terminou ("just to prove i was right/ that it's harder to be friends than lovers") por conta de algo que ele fez ("you put in my hands a loaded gun/ and then told me not to fire it" – um par de versos amaríssimo, irremissível), mas este é o tipo de música em que isso não é importante: o essencial é colocar as coisas em panos limpos – eu roubei seu isqueiro, eu perdi o mapa. o trechinho rock 'n' roll ao final se coaduna com a repetição de dois versos meio irônicos ("so take a deep breath and count back from ten/ and maybe you'll be alright") do modo mais mordaz possível (como se o rompimento não significasse nada para ela, apenas para ele), até porque logo antes temos um retrospecto avassalador do que significa ver morrer coisas importantes: "but you've never been a waste of my time/ it's never been a drag" (a aparente frieza de ver o companheirismo e o amor de meses se transformar num bom passatempo, numa lembrança digna e feliz). e mais: ainda antes, dois versos poderosos – "and the license said you had to stick around until i was dead/ but if you're tired of looking at my face i guess i already am" – finalmente pavoneiam as cicatrizes de guerra e quebram um pouco o cinismo e o desdém que marcam a música antes e que a marcarão em seus instantes finais. o rock 'n' roll não esconde, a memória não pode apagar, a contagem regressiva de dez não vai aliviar (para ele e para ela).

2 comentários:

  1. Os textos desse blog são maravilhosos, Guilherme. Gênio! Sinto sua falta na dramaturgia. Escreva uma peça de teatro...

    C.

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  2. adorei seu blog! parabéns!
    os textos são ótimos e as canções também...
    marília

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